No Brasil todo ano é 1964!
Os militares seguem ostentando seus privilégios, especialmente o de nunca serem punidos por seus crimes. E isso tem um custo para o país!
No apagar das luzes de 2024, enquanto ainda comemorávamos o fato de que, pela primeira vez em toda a sua história, o Brasil puniu - ainda que temporariamente - um general de quatro estrelas por planejar um golpe de estado, recebemos a notícia de que o Supremo Tribunal Militar diminuiu a pena dos envolvidos no assassinato de Evaldo Rosa e Luciano Macedo para três anos em regime aberto.
Uma clara resposta aos desdobramentos do inquérito promovido pela justiça “civil”.
Mais de 80 tiros foram disparados contra o carro do músico. A defesa dos militares alegou que se tratava de um ato de de legítima defesa. Mas defesa contra o que? Evaldo apenas dirigia o veículo normalmente por uma das ruas do subúrbio carioca quando cruzou com os fuzis dos militares. Luciano Macedo foi executado apenas por tentar ajudá-lo. A despeito de todas as provas que pesavam contra os militares, os integrantes do STM optaram por abrandar a sua pena, tornando-a, praticamente, uma punição simbólica.
Sintoma de que ainda estamos presos em 1964, ainda estamos presos nas estruturas da Ditadura Militar.
Como insisto, texto após texto, a postura dos militares, o caráter golpista da própria instituição, não é um mero resultado da formação dos cadetes nas academias, mas uma consequência direta do seu papel autoatribuído ainda durante a formação da república brasileira. Um papel consolidado pela Ditadura Militar, pela forma como ela transformou não apenas a própria constituição, mas a própria imaginação - portanto a subjetividade - dos brasileiros.
O problema vai além da caserna, muito além! O problema está na estrutura do estado que garante aos militares uma série de privilégios dignos de uma aristocracia, como o direito de serem julgados por tribunais próprios, formados apenas por seus pares e/ou indicados por eles. Mas isso não é tudo! O problema está, também, no imaginário do brasileiro que não apenas foi ensinado a aceitar a existência desses privilégios, mas a imaginar os militares como dotados de uma certa eficácia que não poderia ser encontrada em nenhuma outra instituição brasileira.
Trata-se da famigerada ficção ideológica da soberania militar, presente tanto nas palavras daqueles que idolatram as Forças Armadas, que os tomam por heróis da nação, quanto nas palavras - vejam só! - de alguns de seus críticos, que insistem em colocá-los no centro da política nacional, por vezes até emulando teses conspiracionistas nas quais a caserna emerge como a verdadeira cozinha da política brasileira.
E não me entendam mal, os militares constituem sim uma importante força no jogo da política brasileira, mas eles não apenas não são os únicos, como estão muito aquém de serem os principais atores dessa dança. Hoje, não passam de executores (em vários sentidos), de planos de atores maiores.
Mas nada disso importa para os que insistem na repisada tese da soberania militar. Torcedores e (estes) críticos se encontram na ficção ideológica de que os militares constituem uma força irresistível, irrefreável e incontornável, como foram durante a Ditadura Militar. Com outras palavras, para aqueles que os tomam por heróis, os militares devem ser exaltados, para aqueles que os superestimam, ainda que de forma crítica, por vezes tão tímida que quase não se nota a crítica, eles não devem ser desafiados, jamais! Enquanto isso, os mesmos militares seguem incólumes com seus privilégios eternamente garantidos, entre eles, o direito de nunca responderem por seus crimes, como ocorreu no caso de Evaldo Rosa e Luciano Macedo.
E por isso mesmo, por conta desses privilégios, tornam-se os executores ideais daqueles que continuamente intentam contra a democracia brasileira. Esse é o verdadeiro custo dos privilégios da caserna, a fragilidade da nossa democracia.
Estou escrevendo a segunda temporada do Cálice inteiramente dedicada à história desses grupos golpistas formados no seio das Forças Armadas. Mas para isso ocorrer eu preciso da sua ajuda. Visite o nosso CATARSE e apoie o nosso projeto.
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